Archive for janeiro, 2006
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Começando 2006
Pois é… e o Natal passou voando, e também o Ano Novo. Fui surpreendida pelo término do tratamento de quimioterapia do meu pai (agora a longa espera, a expectativa), o aniversário dele, o meu… tudo isto passou num piscar de olhos. Cá estava eu, tentando decidir o que dizer a vocês desta sensação de que não há tempo suficiente para fazer tudo o que eu queria, tudo o que eu devia, tudo o que sou capaz, e descubro na gostosa releitura que Fernando Sabino já falou por mim. Aí, aproveito a carona do mineiro que faz tanta falta, e deixo o recado dele aqui.
Aproveitanto para recomendar com muita ênfase que vocês leiam as crônicas do livro “Deixa o Alfredo Falar!” Eu? Eu não só deixo como gosto muito, né Alfredo? Um beijo enorme de agradecimento pelo delicado telefonema de aniversário que me fez tão feliz!
Com vocês, Fernando Sabino!
“Ano Novo
A ser verdade o que afirmou Jules Renard, o homem começa realmente a envelhecer no dia em que exclama pela primeira vez: nunca me senti tão jovem como hoje. Pois mais um ano se passou, e aqui me vejo desmentindo o pessimismo do escritor francês, ao concluir que nunca me senti tão velho como hoje. E nem por isso fico mais jovem.
Ultimamente têm passado muitos anos – reconheceu outro grande escritor, desta vez Braga, ao que eu acrescentaria: e cada um mais depressa que o outro.
Este último, por exemplo, não durou mais que alguns dias e pronto, lá se foi. Nem tive tempo de fazer um exame de consciência sobre o que ele foi ou deixou de ser para mim, e já o novo ano segue em marcha batida para o seu termo. Mas recolho no próprio Jules Renard alguns trechos de exame semelhante que ele fez em 1895, e que eu poderia endossar sem nenhum esforço:
‘Saído pouco: é preciso ver os outros, para colocá-los no lugar que merecem. Desprezado muito o jornalismo, os pequenos aborrecimentos, os azares da sorte. Lido pouca literatura grega e latina. Pouca esgrima e bicicleta: praticar até enfarar. O trabalho intelectual parecerá, então, uma espécie de salvação num convento onde se pode morrer.’
(…)
‘Amado muito as crianças, posando de bom pai, ostentando muito a indiferença de meu coração relativamente à minha família. Muito enternecimento em relação aos pobres, a quem não dou nada com a desculpa de que nunca se sabe.’
‘Não passo de um miserável, sei disso. Não sou orgulhoso mais. Sei disso, e continuarei.’
‘E bato no peito, e, ao fim digo a mim mesmo: “Entre!” e me recebo muito bem, já perdoado.’
Eis aí: entre minhas faltas, conto também esta – a de me dispensar de enumerá-las, usando como pretexto uma citação literária. E no entanto, cada vez mais cansado da literatura. Certa tendência a escrever sem pensar – as idéias, mal nascidas e nem ainda formuladas, já sendo jogadas no papel. Certas palavras, melhor fora não dizê-las. Encontros a que não compareci. Aquele telefonema que eu devia ter dado, aquela pergunta que ficou sem resposta, aquele gesto brusco. Cartas que deixei de escrever. Às vezes, bastaria um sorriso, um aperto de mão, uma palavra… Aquele silêncio, em meio às palavras.
Porque não me retirei logo naquela noite? Que fiquei esperando? antes não tivesse ouvido. Às vezes é melhor esquecer. Aprender a esquecer. As lembranças também respiram, vivem, crescem e nos devoram.
Novos encontros. Outros que se foram – um que morreu, um que casou, um que simplesmente não conheço mais. Que é que ele quis dizer com aquilo? Esse menino como cresceu! Não havia aquele edifício ali. Gente nova que veio não se sabe de onde, fazer não se sabe o quê. E a leitura desse livro para sempre interrompida. O livro que não escrevi. Saber alemão, ler Goethe no original! Ao dentista tenho ido semanalmente.
Viajado por aí, pretextos fúteis, o regresso sempre o mesmo. Frases. Soube que você andou fora… Longe de mim tal idéia. Mas não tem dúvida alguma. Se você soubesse… Pois então nem se fala mais nisso. Não me leve a mal, por favor. O prazer é todo meu. Tempo de começar. Saber viver. Tirar do nada. Ver. Mostrar. Resolver. Agora ou nunca. Antes que seja tarde. Esquecer e dormir. Ano novo, vida nova: planos recompor, continuar, insistir, recomeçar.
Renascer.”
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