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Perpetuum Mobile
Ele era alto, corpulento. Quem o visse numa foto, barbudo e com um ar feroz, pensaria logo na expressão “voz de trovão”, mas ele era um homem gentil, de voz suave e bem modulada. Seu fogo era profundo, como o magma, só terremotos agitavam a casca de serenidade com força suficiente para fazê-lo entrar em erupção. Bagunceiro confesso, a mente sempre tentando escapar do corpo num devaneio. Amava os livros com paixão.
Ela era de estatura mediana, curvas fartas, sorriso fácil. Adorava conversar. Muitos amigos, e ela os adorava, mas não era gregária. Multidões a incomodavam. Era uma gata. Como todo felino havia que ter seu momento de solitude, geralmente de madrugada, acompanhada da lua. Organizada e metódica, os potes de tempero da cozinha cuidadosamente etiquetados, as panelas arrumadas por tamanho, nas gavetas as roupas organizadas por cor. Amava livros com paixão.
Pois livros têm esta característica de juntar. E eles se juntaram pelos livros, pelas letras, pelas palavras. Ficaram juntos pelas conversas, pelos filmes, pelas ideias. Os papos foram ficando mais longos, a vontade de se ver maior. Mas eles tinham esta polaridade estranha: a bagunça dele, a organização dela.
A bagunça estava lá, perene, impossível de erradicar; o objeto imexível. A organização avançava em ondas, era o mar batendo naquele rochedo do caos; a força irresistível. Como todo o paradoxo, a tensão causa a paralisia. Nem o rochedo bloqueava o mar, nem o mar derrubava o rochedo. E assim viviam, num moto-contínuo.
Foram encontrados, de pé, imóveis, segurando a mesma lata de desodorante, em frente à prateleira de artigos de higiene bucal do supermercado. Meses depois, ainda agarrados à lata, ninguém sabe dizer se eles estão mortos ou não.
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